A casa em que o miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega foi morto no último domingo (9), ainda guarda vestígios do desespero em que ele estava antes da operação policial que o encurralou. Em Esplanada, cidade de 30 mil habitantes no lotoral norte da Bahia, ninguém fala abertamente sobre o ocorrido. Sob anonimato, moradores relatam que Nóbrega foi visto andando armado na fazenda onde se escondeu.
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Localizado à beira de uma estrada em Esplanada, no litoral norte da Bahia, o imóvel de dois quartos, visitado pelo Estado ontem, ainda tem sinais da passagem do ex-policial. Manchas de sangue sujam o chão da sala e deixam rastros até a saída. Além do sangue, há, na casa, um colchão de solteiro sem lençol, roupas desarrumadas e uma quantidade abundante de remédios. Sobre a mesa da sala, 12 pães sem embalagem, sobrevoados por moscas. Um dos quartos está cheio de fibra alimentar para gado. A casa, que pertence ao vereador Gilson de Dedé (PSL), tem sete janelas. Em uma delas se vê uma marca que parece ser de bala, apesar de a polícia ainda não confirmar oficialmente.

Casa em que o miliciano Adriano da Nóbrega foi morto Foto: Wilton Junior/Estadão
Uma camiseta de Adriano ocupa o topo da pilha de roupas encontrada no quarto em que o miliciano ficou. A peça tem os dizeres “Vaqueiro & caveira & rico & meu tio”, na vertical. O livro As 48 Leis do Poder, do escritor norte-americano Robert Greene, estava sobre o colchão.
A morte do miliciano, que estava foragido da Justiça do Rio desde janeiro de 2019, deixou a população local aflita. Com medo de represálias, moradores desconversam quando lhes perguntam onde estavam na hora da operação de domingo. Sem saber ao certo do que Adriano é acusado, moradores ficaram surpresos com a repercussão do caso. A morte agitou a pequena cidade, que tem uma réplica do Cristo Redentor.

Interior da casa em que Adriano Magalhães da Nóbrega foi morto Foto: WILTON JUNIOR / ESTADÃO
“Só se fala disso”, comentou o garçom de um restaurante no Centro, referindo-se à morte do ex-policial.
A mais de 1.600 quilômetros dali, no Rio, Adriano é acusado de chefiar a milícia Escritório do Crime, citada nas investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco. O ex-capitão do Bope também é mencionado na apuração da prática de “rachadinha” no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio. Ele se beneficiaria do esquema por intermédio da ex-mulher, que trabalhava para o parlamentar. A mãe do miliciano também teve cargo lá.
A simplicidade e a bagunça da casa em que Adriano foi morto contrastam com a fazenda na qual passou a última semana de vida. Ficou nela até antes de partir, na noite anterior à morte, para a casa onde foi baleado pela Polícia. Pertencente a Leandro Guimarães, homem conhecido pelas vaquejadas que organiza em Esplanada, o território é vasto e repleto de gado, coqueiros e montanhas.
Fica ali o Parque Gilton Guimarães, uma herança de família que hoje é controlada por Leandro. Ele vive no espaço com a mulher e a filha. Nos últimos dias, contudo, desde que foi preso pela Polícia e depois solto pela Justiça, ninguém sabe para onde foram Leandro e os Guimarães.
“Nunca mais vi. Só estou cumprindo minhas funções, que já sei ‘de cabeça’”, disse um empregado da fazenda, que preferiu não se identificar.
