Partes do Brasil como Itapecerica/MG e da China, podem ter sido vizinhas há 2 bilhões de anos

No meio do caminho, tinha uma grafita na China. Tinha um grafita no meio do caminho de Minas Gerais também. Wilson Teixeira, professor do Instituto de Geociências da USP, não esqueceria desse fato nunca. Na verdade, acabaria percebendo que, de alguma forma, aqueles dois lugares que hoje estão a 17 mil quilômetros de distância um do outro, estiveram unidos em algum momento da vida do planeta.

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Em artigo publicado no periódico Precambrian Research, Teixeira e outros pesquisadores brasileiros e chineses apresentaram evidências de que as regiões de Jiao-Liao-Ji, no nordeste da China, e de Itapecerica, em Minas Gerais, teriam sido formadas lado a lado entre 1,9 e 1,8 bilhão de anos atrás. Nessa época, as massas continentais da Terra estavam dispostas de uma forma muito diferente da atual. Em realidade, elas formavam uma única e gigantesca massa, um supercontinente. Há 1,9 bilhão de anos, este grande pedaço de terra era chamado de Colúmbia, uma formação do éon proterozoico. Ao contrário da Pangeia, formação mais recente e conhecida pela ciência, a configuração do Colúmbia ainda é um mistério. Por isso, os pesquisadores buscam por evidências em rochas antigas para descobrir como era o encaixe desse quebra-cabeças de massas continentais que originou boa parte das rochas que temos hoje. Agora, o que os geólogos estão propondo é que há 2 bilhões de anos os crátons (placas geológicas antigas) São Francisco-Congo e Norte Chinês estavam próximos no supercontinente Colúmbia.
Mina de Itapecerica, em Minas Gerais, onde a grafita é explorada (material escuro inclinado). (Foto: Wilson Teixeira)
Entre as principais evidências do estudo, estão as semelhanças na formação e na idade das jazidas de grafita do cinturão de Jiao-Liao-Ji, no nordeste da China, e do terreno geológico do município mineiro de Itapecerica, Minas Gerais, a cerca de 170 quilômetros de Belo Horizonte. “Esses depósitos de grafita têm uma implicação na história evolutiva da Terra muito importante. Eles representam momentos em que ocorreram colisões entre tratos continentais, o que serviu de mote para o início da nossa pesquisa”, explica Teixeira, que começou a estudar as semelhanças entre os locais após participar de uma expedição ao Jiao-Liao-Ji em um congresso de geologia na China. “Os terrenos estudados representam antigas cadeias de montanhas que foram arrasadas por processos geológicos e erosão. Por isso, hoje aparecem as rochas mais profundas dessas cadeias de montanhas, os granulitos, que são rochas formadas em grandes profundidades na crosta terrestre”, afirma o professor.
Minério de grafita analisado pelos pesquisadores (Foto: Wilson Teixeira)
Os geólogos calcularam a idade dos granulitos através do método Urânio/Chumbo (U/Pb), capaz de datar com precisão o mineral de zircão presente em rochas antigas. Este mineral resiste às altas temperaturas e pressões e, por isso, é essencial ao estudo geológico, permitindo que os cientistas encontrem evidências de como as rochas se cristalizaram nas profundezas da crosta terrestre. O método Urânio/Chumbo (U/Pb) é uma das formas que os geólogos encontraram para tentar compreender a remota constituição geológica do planeta e correlacionar rochas hoje muito distantes umas das outras. Ainda é cedo para afirmar a configuração exata do supercontinente Colúmbia, mas os pesquisadores seguem em busca de novas evidências de que os locais tenham, de fato, estado próximos durante sua formação, há bilhões de anos. “O fato de haver essas comparações permite especular sobre modelos paleogeográficos, que são modelos em que nós tentamos comparar blocos continentais que, no passado, teriam sido próximos”, explica Teixeira. À procura de evidências que reforcem (ou não) a teoria, geólogos chineses visitaram o terreno de Minas Gerais em novembro de 2017 para analisar a formação rochosa local. Em setembro deste ano, será a vez dos pesquisadores brasileiros retornarem à China para realizar mais estudos. Atualmente, uma equipe coordenada pelo geofísico Manoel D’Agrella, pesquisador do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP, tem estudado o registro paleomagnético das rochas, ou seja, sua “memória” paramagnética, capaz de determinar em que local do campo magnético da Terra as rochas foram formadas. *Com supervisão de Isabela Moreira/Revista Galileu

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