Ainda faltam duas semanas para o encerramento de 2025, mas o Brasil acaba de atingir um marco fiscal preocupante. Pela primeira vez na história, os gastos públicos primários do país superaram a barreira dos R$ 5 trilhões. A projeção da plataforma Gasto Brasil — iniciativa da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) com a Associação Comercial e Empresarial de São Paulo (ACSP) — é que o ano feche com um desembolso total de R$ 5,2 trilhões.
Este valor representa aproximadamente 44% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional de 2024, evidenciando o peso gigantesco do Estado sobre a atividade econômica. O painel contabiliza o "gasto real": apenas o que foi efetivamente pago, deixando de lado juros da dívida ou valores meramente empenhados.
O Custo da Ineficiência
Para Cláudio Queiroz, coordenador do Gasto Brasil e consultor da CACB, o problema não é apenas o volume, mas a qualidade da aplicação desses recursos. Ele ressalta que o Brasil possui condições naturais privilegiadas, mas falha na gestão administrativa.
“O Brasil seria o melhor lugar para se morar do mundo. Não temos terremotos, maremotos ou terrorismo. Poderíamos viver muito bem, mas isso não é realidade por falta de um controle governamental efetivo e de uma distribuição eficiente”, avalia Queiroz.
De acordo com o levantamento, a conta é dividida da seguinte forma:
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União: Responsável por 42% do total.
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Estados e Municípios: Somam 28% dos gastos cada, evidenciando a descentralização do custeio da máquina pública.
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Selic a 15% e o "Estrangulamento" do Setor Produtivo
O volume de gastos públicos é apontado como o principal culpado pela manutenção da Taxa Selic em 15% ao ano, o maior nível dos últimos 20 anos. O Comitê de Política Monetária (Copom) tem utilizado os juros altos como um "freio de arrumação" para conter a inflação impulsionada pela demanda estatal.
Embora a estratégia tenha surtido efeito — com a inflação finalmente caindo abaixo do teto da meta de 4,5% após 13 meses —, o preço pago pelo setor produtivo é alto. Queiroz aponta um cenário de "estrangulamento" do varejo, que sofre com a escassez de crédito e o encarecimento dos financiamentos. O resultado é um resfriamento econômico: o PIB de 2025 deve fechar em 2,2%, a menor taxa desde o ano pandêmico de 2020.
O "Nó" das Reformas e o Fantasma de 2026
O levantamento mostra que a estrutura de gastos é rígida: dois terços (66%) de tudo o que o governo arrecada e gasta vai para benefícios previdenciários, pagamento de servidores e encargos sociais.
Especialistas da CACB defendem que reformas administrativa e previdenciária são inevitáveis para evitar um colapso fiscal em 2027. No entanto, o calendário político surge como o maior obstáculo. Com as eleições de 2026 no horizonte, a tendência histórica é o oposto do ajuste: o aumento de despesas para garantir palanques eleitorais.
“Seja qual for o governo, de direita, esquerda ou centro, em 2027 será obrigatório mexer em reformas de impacto para equilibrar as contas”, projeta Queiroz.
Transparência como Ferramenta de Cidadania
A plataforma Gasto Brasil utiliza dados diretos do Tesouro Nacional para oferecer ao cidadão um raio-x em tempo real. Além dos totais por ente federativo, a ferramenta permite discriminar gastos por poderes: Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública.
O objetivo é que, ao dar visibilidade ao destino dos impostos, a sociedade possa cobrar maior eficiência e austeridade dos gestores públicos, especialmente em um momento de transição tributária, com a nova reforma começando a vigorar no próximo ano.