O Ministério das Relações Exteriores do Brasil, o Itamaraty, está trabalhando para agendar, nas próximas semanas, um diálogo por videoconferência ou telefone entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A possibilidade da conversa surgiu após Trump mencionar o interesse durante seu discurso na abertura da Assembleia-Geral da ONU, nesta terça-feira (23).
Abertura para o Diálogo e Questões em Pauta
De acordo com o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, os dois líderes já haviam conversado brevemente na antessala da assembleia e deixaram a porta aberta para um futuro contato. Em entrevista à CNN Internacional, Vieira destacou que o presidente Lula está sempre disposto a conversar com qualquer chefe de Estado que queira discutir temas com o Brasil. No entanto, por conta da agenda cheia de Lula, que retorna ao Brasil nesta quarta-feira, a conversa deverá ser por meio virtual. “Lula está aberto a conversar e estou muito feliz que isso aconteceu”, afirmou o ministro.
Apesar da disposição para o diálogo, o Brasil mantém uma posição firme em questões sensíveis. O ministro Mauro Vieira deixou claro que, embora o país esteja pronto para negociar sobre tarifas comerciais, não há espaço para recuo na esfera política relacionada ao julgamento de Jair Bolsonaro. Vieira foi enfático ao afirmar: "não há espaço, nem mesmo um centímetro, para negociar" a respeito da pressão dos EUA sobre o processo judicial.
Sanções e Condenação de Bolsonaro: Tensão nos Bastidores
A postura do Itamaraty reflete a tensão recente entre os dois países. Na semana passada, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão por crimes como golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e organização criminosa armada. A condenação, proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), foi resultado de um processo “minucioso”, com direito de defesa garantido, como enfatizou Lula em seu discurso na ONU.
Essa condenação e o avanço da justiça brasileira sobre o caso de Bolsonaro foram seguidos por uma nova rodada de sanções anunciada pelo governo Trump a autoridades do Executivo e do Judiciário brasileiros. Essa interferência, nas palavras de Lula, é uma “ingerência em assuntos internos” que não tem justificativa e conta com o apoio da extrema-direita e de antigas hegemonias.
O Breve Encontro na ONU e as Declarações de Trump
O encontro entre os dois líderes na ONU, embora breve, foi um momento de grande atenção. Tradicionalmente, os presidentes de Brasil e EUA são os primeiros a discursar na Assembleia-Geral. Pela primeira vez, Trump e Lula se encontraram pessoalmente, o que o presidente americano descreveu como um momento de "química". "Ele me parece um homem muito bom. Ele gostou de mim, eu gostei dele. E eu só faço negócios com quem eu gosto", disse Trump, em um tom surpreendentemente amistoso.
No entanto, o tom amistoso foi ofuscado por críticas. Em seu discurso, Trump acusou o Brasil de "interferir nos direitos e liberdades de cidadãos americanos", alegando que isso foi feito com a colaboração de administrações anteriores, especialmente a de Joe Biden. A fala do presidente americano foi vista como uma resposta direta ao discurso de Lula, que, sem citar Trump nominalmente, condenou a pressão dos EUA e defendeu a soberania e a estabilidade das instituições brasileiras.
Apesar das farpas trocadas nos discursos, a disposição para o diálogo por parte de ambos os líderes sugere que, nos bastidores, há um interesse em manter canais de comunicação abertos para tentar gerir as tensões políticas e econômicas entre as duas maiores democracias das Américas.