Duas redes de farmácias mineiras aderiram à ação de socorro a vítimas de violência. Pandemia teria agravado situação.
Representantes da sociedade civil pediram, nesta quinta-feira (1°), que o Governo de Minas use sua estrutura de comunicação para ajudar na divulgação da campanha Sinal Vermelho para a Violência Doméstica, realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). A demanda foi feita em audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
A matéria continua após a publicidade
A campanha, realizada em Minas Gerais em parceria com a Drogaria Araújo e a Rede Farma, foi lançada nacionalmente em 10 de junho deste ano, segundo o portal da AMB. A proposta é de que a mulher vítima de violência doméstica desenhe um “X” vermelho na palma da mão e mostre a qualquer atendente da farmácia, que, ao ver o sinal, deverá acionar a autoridade policial imediatamente pelo telefone 190.
A campanha já conta a adesão de mais de 10 mil farmácias em todo o Brasil. Em Minas, o Conselho Regional de Farmácias aderiu à iniciativa no último dia 23.
[audio mp3="https://destaknewsbrasil.com.br/wp-content/uploads/2020/10/Sonora-ALMG-02-de-Outubro.mp3"][/audio]
De acordo com a coordenadora do Movimento de Mulheres da Zona Norte de Belo Horizonte e do Movimento Mais Minas no Estádio, Adriana Ferreira, a pandemia de covid-19 "piorou outra pandemia no País", a da violência doméstica.
Adriana Ferreira mostra como a mulher vítima de violência pode pedir socorro - Foto:Henrique Chendes
Segundo ela, a restrição de ir e vir imposta pelo isolamento social tornou ainda mais precária a situação de muitas mulheres. “Quantas delegacias estão em funcionamento? Não temos mais contato com pessoas, não temos a quem recorrer. Mas a farmácia fica aberta 24 horas, o que nos possibilita pedir socorro. São apenas duas ações: fazer o "X" vermelho na mão e o atendente discar 190. E se a mulher não puder ficar aguardando o policial, ele é solicitado a ir na casa dela”, explicou.
Adriana elogiou a atuação da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da ALMG, que, segundo ela, possibilita que as demandas das mulheres mineiras “possam existir”. “Somos 52% da população brasileira, mas quem preza por nossas vidas em Minas? Precisamos de outra audiência convocando as redes de farmácia do Estado e o Conselho Regional de Farmácia a virem aqui garantir uma adesão ampla. O Tribunal de Justiça aderiu, mas a sociedade precisa se engajar. Só duas redes de farmácia participando é pouco. Precisamos de visibilidade”, reforçou.
A juíza e diretora da AMB, Maria Domitila de Prado Manssur, manifestou revolta pelo fato de o Brasil ter uma legislação avançada de combate à violência contra a mulher, representada pela Lei Maria da Penha, e simultaneamente ter índices preocupantes de agressão.
“O Brasil ocupa o 5º lugar mundial no ranking de países que mais agridem os direitos humanos de mulheres e meninas. A informação é do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos. Uma mulher é agredida a cada quatro minutos no País. Precisamos mudar isso. As farmácias foram escolhidas por terem grande credibilidade junto à população. Tivemos 90 dias para desenvolver essa campanha em Minas, envolvemos as Guardas Civis Metropolitanas, a Policia Civil e a Militar para desenvolver um protocolo. E torcemos para que as mulheres sejam atingidas diretamente por essa iniciativa. Precisamos do engajamento dos poderes e da sociedade civil, do terceiro setor e da iniciativa privada em torno dessa campanha”, ressaltou Maria Domitila.
Governador é criticado por normatizar violência
Antes da reunião, foi aprovado requerimento da deputada Marília Campos (PT) com manifestação de protesto contra pronunciamento do governador Romeu Zema por dizer que “a violência contra a mulher é um instinto natural do ser humano”, durante o lançamento do programa MG Mulher, em março deste ano. A fala do governador, que endossaria um preconceito enraizado socialmente, foi duramente criticada.
Adriana Ferreira disse que, por causa desse tipo de pensamento, as mulheres devem cada vez mais se organizar e levantar suas vozes e suas bandeiras. “Em BH, as mulheres negras e de baixa renda são as que mais sofrem violência. E ninguém preza pela segurança delas”, acrescentou.
A presidenta da comissão, deputada Andréia de Jesus (Psol), disse que o Governo de Minas Gerais virou as costas para as políticas sociais e de assistência, sendo que a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) não dá sequer manutenção devida às políticas públicas existentes.
“Isso não é estado mínimo, é estado ausente da vida das pessoas. E isso aumenta a política de morte, com os casos crescendo cada vez mais. A omissão do Estado fortalece a violência e o Executivo tem instrumentos para conscientizar mais pessoas e dar mais visibilidade a essa campanha”, afirmou a parlamentar.
A defensora pública Maria Cecília Oliveira destacou que a origem da violência contra a mulher é um problema mais profundo e não pode ser naturalizado nem simplificado num discurso biológico. “Não é da natureza do homem ser violento. Isso é fruto de uma cultura patriarcal e machista, que coloca que as mulheres podem ser subjugadas pelos homens”, disse. Ela também afirmou que, em muitos casos, a dependência financeira ou emocional da mulher dificulta que ela saia do ciclo de violência, sendo necessário falar também de assistência financeira e acompanhamento psicológico para as vítimas.