A decisão do governo dos Estados Unidos de revogar o visto do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), aprofundou a deterioração das relações diplomáticas entre Brasília e Washington. O episódio, ocorrido na sexta-feira (18), gerou forte reação do governo brasileiro e acentuou o temor de novas sanções contra autoridades do Brasil. A medida foi anunciada pelo secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, que acusou Moraes de promover uma “caça às bruxas política” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de violar princípios de liberdade de expressão.
Rubio afirmou que a decisão atinge Moraes, seus familiares e “aliados na Corte”, sem especificar nomes. A ação dos EUA ocorre no mesmo dia em que o ministro determinou o uso de tornozeleira eletrônica por Bolsonaro e impôs ao ex-presidente restrições como o recolhimento domiciliar noturno, a proibição de uso de redes sociais e de contato com embaixadas e diplomatas. As medidas foram tomadas a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), com base em suspeitas de tentativa de obstrução das investigações sobre os atos golpistas de 2022.
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, classificou a decisão norte-americana como uma “retaliação agressiva e mesquinha” e acusou Eduardo Bolsonaro — que reside nos EUA — de articular com aliados da direita dos EUA para atacar as instituições brasileiras. “O Brasil está com a Justiça, não com os traidores”, escreveu Gleisi nas redes sociais.
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), disse que a revogação representa uma “tentativa de constranger magistrados e interferir indevidamente em nossa soberania”. O advogado-geral da União, Jorge Messias, também se manifestou em defesa do STF. “O exercício da jurisdição não pode sofrer, em hipótese alguma, assédio de índole política, muito menos mediante o concurso de Estado estrangeiro”, declarou.
A atitude da Casa Branca, sob a gestão de Donald Trump, é vista pelo governo Lula como um movimento coordenado com aliados bolsonaristas que buscam intimidar o Judiciário. Segundo integrantes do governo, há expectativa de que novas ações sejam adotadas por Washington, possivelmente com base na Lei Magnitsky, legislação que permite a imposição de sanções a estrangeiros acusados de corrupção ou violações de direitos humanos.
Aliados do presidente Lula avaliam que a ofensiva americana representa uma escalada diplomática e que o Judiciário brasileiro está sendo atacado por cumprir suas funções institucionais. Há preocupação de que outras autoridades do STF (e até do governo) possam ser alvo de medidas similares. O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo no Congresso, reagiu com ironia à decisão americana: “Moraes tem outros 192 países à disposição. Não serão chantagens e ameaças que curvarão a coluna da soberania do Brasil.”
A medida foi comemorada por Eduardo Bolsonaro, que elogiou Trump e Rubio e afirmou que agora “há autoridade brasileira que não poderá ver seus familiares nos EUA também”. Integrantes do Planalto apontam que a revogação do visto é reflexo da aliança entre o bolsonarismo e o trumpismo, que teria como objetivo enfraquecer a credibilidade das instituições democráticas brasileiras no cenário internacional.
A crise evidencia o enfraquecimento do diálogo entre os dois países e coloca em xeque os canais diplomáticos tradicionais. O Itamaraty, até o momento, não se pronunciou oficialmente sobre o caso. Nos bastidores, porém, auxiliares de Lula admitem o receio de que a tensão avance para o campo econômico ou afete cooperações bilaterais em curso.