O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que as redes sociais serão diretamente responsabilizadas por postagens ilegais realizadas por seus usuários. A decisão, proferida nesta quinta-feira (26), com um placar de 8 votos a 3, redefine a forma como as plataformas digitais devem lidar com conteúdos prejudiciais e criminosos.
Fim da Limitação do Artigo 19 do Marco Civil da Internet
A corte declarou a parcial inconstitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet, que até então limitava a responsabilização das redes sociais por conteúdos de terceiros. Essa mudança representa um marco legal, exigindo que as plataformas ajam proativamente para remover conteúdos ilegais e garantir a segurança dos usuários.
Conteúdos Ilegais Alvo da Decisão
A nova diretriz do STF exige que as plataformas removam imediatamente conteúdos considerados ilegais, abrangendo uma ampla gama de temas, incluindo:
- Atos antidemocráticos
- Terrorismo e apologia ao terrorismo
- Incitamento ao suicídio e automutilação
- Discriminação de qualquer natureza (racial, religiosa, sexual, etc.)
- Crimes contra a mulher (violência doméstica, feminicídio, etc.)
- Pornografia infantil
- Tráfico de pessoas
Notificações Extrajudiciais e Responsabilização
A partir de agora, as plataformas deverão levar em consideração notificações extrajudiciais ao lidar com conteúdos irregulares. Isso significa que, ao receber uma denúncia formal sobre uma publicação ilegal, a rede social deverá analisar o caso e tomar as medidas cabíveis. Caso a publicação não seja removida após essa notificação e, posteriormente, a Justiça determine que o conteúdo era de fato irregular, a rede será responsabilizada e estará sujeita a sanções.
O Voto Contrário e a Defesa da Liberdade de Expressão
O último voto sobre a questão foi proferido pelo ministro Nunes Marques, que se posicionou contra a responsabilização direta das redes sociais. O ministro argumentou que a responsabilização direta deveria ser criada pelo Congresso Nacional, defendendo que a liberdade de expressão é uma cláusula pétrea da Constituição e deve ser protegida. Segundo Nunes Marques, a responsabilidade pela publicação de conteúdos é de quem causou o dano, ou seja, o usuário.
“A liberdade de expressão é pedra fundamental para necessária troca de ideias, que geram o desenvolvimento da sociedade, isto é, apenas por meio do debate livre de ideias, o indivíduo e a sociedade poderão se desenvolver em todos os campos do conhecimento humano”, afirmou o ministro Nunes Marques.
Votos Favoráveis à Responsabilização
Nas sessões anteriores, os ministros Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Luiz Fux, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia se manifestaram a favor da responsabilização das redes sociais. Os ministros André Mendonça e Edson Fachin votaram pela manutenção das atuais regras que impedem a responsabilização direta das plataformas.
Argumentos dos Ministros
A ministra Cármen Lúcia avaliou que houve uma transformação tecnológica significativa desde 2014, quando o Marco Civil da Internet foi sancionado, e que as plataformas se tornaram “donas das informações”. Segundo a ministra, as plataformas utilizam algoritmos que “não são transparentes”.
O ministro Alexandre de Moraes argumentou que as big techs impõem seu modelo de negócio “agressivo”, sem respeitar as leis do Brasil, e que não podem ser uma “terra sem lei”.
Para o ministro Flávio Dino, o provedor de aplicações de internet poderá ser responsabilizado civilmente pelos danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros.
O ministro Gilmar Mendes considerou que o Artigo 19 do Marco Civil da Internet está “ultrapassado” e que a regulamentação das redes sociais não representa uma ameaça à liberdade de expressão.
O ministro Cristiano Zanin votou pela inconstitucionalidade do artigo, afirmando que o dispositivo não é adequado para proteger os direitos fundamentais e impõe aos usuários o ônus de acionar o Judiciário em caso de postagens ofensivas e ilegais.
Os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli votaram para permitir a exclusão de postagens ilegais por meio de notificações extrajudiciais, ou seja, pelos próprios atingidos, sem a necessidade de uma decisão judicial prévia.
O ministro Luís Roberto Barroso defendeu que a ordem judicial é necessária para a remoção somente de postagens de crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria). Nos demais casos, como publicações antidemocráticas e terrorismo, a notificação extrajudicial seria suficiente para a remoção do conteúdo, cabendo às redes o dever de cuidado para avaliar as mensagens em desacordo com suas políticas de publicação.
Casos Concretos Julgados pelo STF
O STF julgou dois casos concretos que envolvem o Marco Civil da Internet e que chegaram à Corte por meio de recursos:
- Na ação relatada pelo ministro Dias Toffoli, o tribunal julgou a validade da regra que exige ordem judicial prévia para responsabilização dos provedores por atos ilícitos. O caso tratava de um recurso do Facebook para derrubar uma decisão judicial que condenou a plataforma por danos morais devido à criação de um perfil falso de um usuário.
- No processo relatado pelo ministro Luiz Fux, o STF discutiu se uma empresa que hospeda um site na internet deve fiscalizar conteúdos ofensivos e retirá-los do ar sem intervenção judicial. O recurso foi protocolado pelo Google.
Impacto da Decisão
A decisão do STF tem um impacto significativo para a internet no Brasil, exigindo que as redes sociais adotem medidas mais rigorosas para combater a disseminação de conteúdos ilegais e proteger os direitos dos usuários. A responsabilização das plataformas poderá levar a uma maior moderação de conteúdo e a um ambiente online mais seguro e transparente.